O Compliance como Diferencial para Escritórios de Advocacia

Compliance

Compliance é um assunto que vem sendo bastante abordado nos artigos publicados pela Bi2 Partners devido à sua crescente relevância para o meio corporativo, em especial no que se refere à reputação e credibilidade da empresa perante seus stakeholders[1].

Vale ressaltar que o compliance vem ganhando força no Brasil, havendo também um aumento da demanda por serviços relacionados à área, como a estruturação de programas internos de governança, anticorrupção e antilavagem de dinheiro, investigações de fraudes, due diligence de terceiros, entre outros.

Em especial, sobre o due diligence, a nova Lei Anticorrupção[2] determina que as empresas são corresponsáveis por todos os envolvidos em sua cadeia produtiva, inclusive por seus parceiros, fornecedores e prestadores de serviços. Esses riscos de corresponsabilidade podem ser mitigados através do due diligence de terceiros, e consequentemente, temos observado um aumento na demanda por tal serviço. Pesquisas recentes indicam que a Lei Anticorrupção e a Operação Lava Jato ampliaram a preocupação das empresas com a exposição a esses riscos, sendo que o número de diligências solicitadas avançou de 2.476 em 2015 para 9.079 ao final de 2019[3].

E foi justamente o setor de construção o principal usuário desse serviço no último ano, até mesmo pela repercussão do desfecho de processos deflagrados contra as grandes do ramo, que acarretaram diversas penalidades. A partir de então, sentimos um amadurecimento da preocupação preventiva em relação à integridade, conformidade e gestão de riscos em todos os níveis de atuação e relacionamentos das empresas, reforçando a necessidade da implementação ou fortalecimento de programas de compliance.

Por que é tão importante retomar esse assunto sob o ponto de vista dos escritórios de advocacia?

Especificamente na área legal, o compliance jurídico é o que assegura que as práticas do dia a dia da empresa estão em conformidade com os estatutos internos e com a legislação que rege suas atividades.

Portanto, é uma tendência natural de mercado que as empresas passem a exigir cada vez mais que seus assessores jurídicos apresentem uma estrutura sólida de governança, demonstrando preocupação com a gestão de riscos e reputação do seu negócio. Os escritórios de advocacia precisam, portanto, estar cada vez mais atentos às ferramentas de controle para a conformidade, inclusive em razão da natureza da sua prática como conselheiros dos responsáveis pelo compliance nas empresas clientes.

Vale, portanto, insistir que tais ferramentas de controle passam a ser não apenas importantes, mas quase obrigatórias para os escritórios de advocacia terem processos internos estruturados, reforçando o comprometimento de seus sócios e colaboradores com a governança, integridade e ética, minimizando assim os riscos em torno de toda a cadeia envolvida em sua prática.

Para ilustrar ainda mais a pertinência desse assunto, chegou a ser citado na mídia que, em 90 por cento dos casos de corrupção no Judiciário há participação de advogados; e que, nos demais poderes,  a operação Lava Jato vem levantando sérias suspeitas da recorrente presença de firmas de advocacia em esquemas de lavagem de dinheiro e intermediação de propina.[4] E no tocante à sensibilidade dessas notícias, torna-se imprescindível prevenir e zelar pela reputação da categoria como um todo e da credibilidade dos  escritórios isentos de tais desvios de conduta e improbidades.

Finalmente, sendo os advogados formadores de opinião e conselheiros para os gestores de empresas quanto a assuntos legais, é esperado que incentivem seus clientes a implementar ou reforçar programas de compliance primando pela conformidade e a ética, evitando prejuízos reputacionais e legais em todas as esferas de atuação da empresa.

E é justamente neste contexto que chama a atenção o fato de muitos escritórios de advocacia – dos quais muitas empresas, grandes, médias ou pequenas são clientes – ainda não possuírem um programa interno de compliance, embora muitos deles ajudem a implementar o compliance e a nova LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) nessas companhias.

A demanda crescente por programas de compliance como oportunidade de negócio

Empresas de grande porte, principalmente as multinacionais, já estão acostumadas a manter um programa de compliance e adaptá-lo às demandas do país de origem e dos mercados em que atuam. Para essas empresas, passar pela pandemia com os desafios econômicos foi menos problemático, pois sua própria estrutura interna tornou mais fácil visualizar onde e como poderiam ser feitos os ajustes, tanto que essas empresas estão saindo ainda mais fortes desse processo. Já em relação a empresas de médio e pequeno porte, essas tiveram um pouco mais de dificuldade e foram as que mais sofreram com a crise pandêmica durante o ano de 2020.

A exceção à essa regra quanto às empresas de pequeno porte foram as startups, em grande parte pela sua capacidade de inovação, criatividade e visão para detectar demandas relevantes da sociedade e sobretudo, de entregar produtos e serviços voltados ao seu suprimento. Tal visão e capacidade de implementar as bases de um novo negócio, viabilizando sua operação, atrai investidores, muitas vezes institucionais, por complementarem as estratégias de crescimento de outras empresas.

A possibilidade de captação de recursos, exige que as startups se estruturem com base nas regras de transparência e governança, incluindo a conformidade com os princípios ESG (Environmental, Social and Governance), por exemplo, já que essas empresas se tornam adjacentes das investidoras, ou estão sujeitas ao escrutínio dos potenciais aportadores de capital após a fase de bootstrapping[5] e nas etapas subsequentes de financiamento. Por isso mesmo, as startups representam um segmento potencial para implementação de programas de compliance, além da própria assessoria jurídica quanto à definição de contratos com investidores.

Outro ponto a ser destacado como oportunidade, é que devido à pressão durante a crise, muitas empresas passaram por processos de fusões e aquisições às pressas, sem que um processo adequado de due diligence fosse feito e sem que fosse verificado se as empresas adquiridas ou contratadas também possuíam um programa de compliance.

No total foram 1.549 transações de M&A (Mergers & Aquisitions) realizadas no Brasil no ano passado, o que representou um valor de R$229,50 bilhões, sendo que desse total, 491 transações foram realizadas no quarto trimestre de 2020, quando a economia começou a se recuperar[6]. Portanto, a necessidade de implantação ou revisão de programas de compliance com certeza virá à tona em 2021, representando outro nicho de oportunidade para prestação desse serviço.

Além disso, com a LGPD aprovada, há mais um ponto a ser levado em consideração em relação às empresas adquiridas e com as quais novas parcerias têm sido firmadas: a garantia de proteção de dados dos clientes, lembrando que, caso a empresa parceira tenha algum problema com a lei, a outra pode ser responsabilizada, de acordo com a Lei Anticorrupção, caso fique provado que o intuito tenha sido no interesse ou benefício da mesma.

Conheça os serviços de Compliance: Diagnóstico, Implementação, Monitoramento e Auditoria da Bi2 Partners. Se preferir, entre em contato direto: [email protected] | +55 11 96476-9418

Quais as implicações da ausência de um programa de compliance em escritórios de advocacia?

Como reflexo de uma questão cultural, a ausência de um programa de compliance em muitos escritórios de advocacia se dá por causa da confiabilidade inerente à atividade jurídica, pelo fato de se tratar de uma área que trabalha com leis, detendo amplo conhecimento favorável ao cumprimento das mesmas.

Como reflexo de uma questão cultural, a ausência de um programa de compliance em muitos escritórios de advocacia se dá por causa da confiabilidade inerente à atividade jurídica, pelo fato de se tratar de uma área que trabalha com leis, detendo amplo conhecimento favorável ao cumprimento das mesmas.

Por isso, do ponto de vista externo e dos clientes, é quase impensável que um escritório de advocacia não tenha uma boa estrutura de controles internos, antifraude, anticorrupção e antilavagem, regrada por um sólido programa de compliance e que não esteja preparado para garantir conformidade, segurança e confiabilidade em seus processos.

E mais uma vez, surpreendentemente, foi divulgado que do total de escritórios de advocacia no Brasil, ainda é uma minoria que possui Código de Ética, Conduta e Governança disponível publicamente[7]. E como a maioria desses escritórios oferece serviços de compliance para as empresas, mediante informações como esta, do ponto de vista reputacional e de marketing, torna-se fundamental não apenas implementar tal programa internamente, como também divulgar publicamente a título de transparência, tais códigos e programas junto com a missão e valores da firma, bem como quaisquer iniciativas que demonstrem como estão atentos ao compliance em seu próprio ambiente de trabalho.

Outro exemplo de informação que contribui para minar a confiança inerente à advocacia foi a que circulou recentemente de maneira especulativa, sobre os escritórios de advocacia estarem isentos de cumprir com os requisitos da LGPD, pela confiabilidade inerente à prática. Segundo o Comitê de Direito Digital do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa)[8], os escritórios de advocacia estão sim sujeitos à Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais. Na opinião do comitê, qualquer divulgação nesse sentido é, na verdade, prejudicial para a categoria, porque pode passar uma imagem negativa perante a sociedade, sugerindo um movimento para criar privilégios em torno dessa prática.

Além das especulações, vale ressaltar que é preciso considerar notícias frequentes na mídia sobre escritórios de advocacia sendo alvo de operações policiais, seja por associação com o crime organizado, por pagamento de propinas ou por lavagem de dinheiro.

Em setembro de 2020, por exemplo, a Lava Jato lançou a Operação E$quema S, que visitou 50 endereços de advogados em São Paulo, Rio de Janeiro e Brasília, devido a uma investigação que vinha sendo realizada para apurar o desvio de R$150 milhões do Sistema S do Rio. De acordo com a investigação, o que movimentou o desvio foram contratos frios de serviços advocatícios[9].

Diante de tudo isso, é natural que empresas que desejem firmar parcerias com escritórios de advocacia busquem, antes de mais nada, realizar um due diligence e que demandem desses escritórios um programa de compliance interno ativo, para que comprovem ter controle sobre as atividades de todos os colaboradores da prática, evitando assim que o risco recaia em cima da empresa que está realizando a contratação.

Um levantamento feito pelo escritório de advocacia Tozzini Freire com 130 executivos no fim do ano passado, mostrou que as políticas de controle eram a segunda maior prioridade dos clientes no âmbito jurídico e econômico (citadas por 74% dos ouvidos), atrás apenas de tributação (82%) e à frente até mesmo dos assuntos trabalhistas (71%)[10]. Assim, o compliance passou a ser uma exigência de mercado, abrangendo a área de prestação de serviços jurídicos como um todo.

Some-se a isso o fato de a OAB ter proposto a instauração de uma autorregulação, que seria uma proposta de normas e orientações técnicas para que advogados prestem contas de seus serviços. O texto, que ainda está em discussão, determina que o advogado precisará comunicar ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) toda operação comercial e financeira de que participa e suspeita. Se for provado que o advogado recebeu honorários com dinheiro ilegal, ele poderá ser processado por receptação, segundo a Lei de Prevenção à Lavagem de Dinheiro[11].  A proposta ainda sofre a resistência de muitos advogados, mas é um passo importante para proteger e elevar a credibilidade da prática de advocacia[12].

Considerações finais

É essencial que os escritórios de advocacia tenham garantidos por lei a proteção do sigilo e da inviolabilidade do local de trabalho para que possam oferecer a proteção de informações pessoais e sobre os processos de seus clientes [13].

Para não terem tais direitos comprometidos, os escritórios precisam reforçar internamente seus programas de governança e LGPD, pois os danos que uma investigação anticorrupção ou um vazamento de dados pessoais de clientes podem causar à reputação da firma e de seus sócios é inestimável.

Para tanto, é imprescindível implementar processos, controles e normas de conformidade não somente com as leis, mas com a integridade e a ética que impeçam desvios de conduta, contratação de profissionais, fornecedores e parceiros de idoneidade duvidosa, minimizem problemas como desvios e esquemas ilícitos como propina – para testemunhos e depoimentos – apenas para citar alguns exemplos.

No âmbito competitivo, o compliance interno tende a colocar o escritório de advocacia em vantagem em relação à concorrência, uma vez que conforme citado, as empresas cada vez mais buscam ser representadas por firmas que possuam políticas de controle.

A Bi2 Partners presta constantemente serviços de suporte à litígios, investigação, arbitragem, implementação e monitoramento de programas de governance e integridade ética para a conformidade, entre outros, para os escritórios de advocacia mais renomados no país. Através de seus especialistas na área de compliance e LGPD, coloca-se à inteira disposição para assessorar práticas advocatícias na implementação de programas de governança e mitigação de riscos de negócios para a firma, seus sócios, clientes e parceiros.

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[1] O conceito de stakeholders foi proposto inicialmente pelo filósofo Robert Edward Freeman para definir o indivíduo ou organização que é afetado pelas ações de uma empresa: acionistas, investidores, proprietários, empregados, sindicatos, clientes, consumidores, governo, órgãos reguladores, ONGs etc.

[2] Dispõe sobre a responsabilização objetiva administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

[3] Disponível em: https://www.legiscompliance.com.br/artigos-e-noticias/2760-combate-a-corrupcao-pesquisa-inedita-aponta-crescimento-de-267-na-demanda-de-diligencias-sobre-fornecedores-nos-ultimos-cinco-anos. Acesso em 29 de janeiro de 2021.

[4] Disponível em https://migalhas.uol.com.br/depeso/304247/compliance–na-advocacia. Acesso em 29 de janeiro de 2021.

[5] bootstrapping é basicamente o autofinanciamento, a “arte” de empreender sem nenhum financiamento. Disponível em https://www.startse.com/noticia/investidores/conheca-os-tipos-de-investimento-para-startups. Acesso em 02 de fevereiro de 2021.

[6] Disponível em https://valorinveste.globo.com/mercados/renda-variavel/empresas/noticia/2021/01/18/fusoes-e-aquisicoes-caem-5percent-2020-mas-negocios-no-setor-de-tecnologia-sobem-19percent.ghtml. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

[7] Disponível em https://www.siqueiracastro.com.br/codigodeetica/codigo-de-etica-e-compliance-PT.pdf. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

[8] Disponível em https://www.linkedin.com/feed/update/urn:li:activity:6762372768794210304. Acesso em 29 de janeiro de 2021.

[9] Disponível em https://oglobo.globo.com/opiniao/iniciativa-de-autorregulacao-da-oab-bem-vinda-24830377. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

[10] Disponível em: https://jus.com.br/artigos/79396/o-compliance-como-ferramenta-estrategica-na-advocacia-corporativa. Acesso em 29 de janeiro de 2021.

[11]  Dispõe sobre os crimes de lavagem, direitos e valores, sobre a prevenção da utilização do sistema financeiro para os ilícitos previstos na Lei, cria o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – COAF, e dá outras providências. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm#:~:text=L9613&text=LEI%20N%C2%BA%209.613%2C%20DE%203%20DE%20MAR%C3%87O%20DE%201998.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20os%20crimes%20de,COAF%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

[12] Disponível em https://oglobo.globo.com/opiniao/iniciativa-de-autorregulacao-da-oab-bem-vinda-24830377. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

[13] Disponível em https://oglobo.globo.com/opiniao/iniciativa-de-autorregulacao-da-oab-bem-vinda-24830377. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

Referências

BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 9613, de 3 de março de 1998. Portal da Legislação, Brasília, 3 de março de 1998. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9613.htm#:~:text=L9613&text=LEI%20N%C2%BA%209613%2C%20DE%203%20DE%20MAR%C3%87O%20DE%201998.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20os%20crimes%20de,COAF%2C%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subchefia para Assuntos Jurídicos. Lei nº 12846, de 1º de agosto de 2013. Portal da Legislação, Brasília, 1º de agosto de 2013. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

CÓDIGO DE ÉTICA, CONDUTA E COMPLIANCE DO ESCRITÓRIO SIQUEIRA CASTRO ADVOGADOS, São Paulo, 2018. Disponível em https://www.siqueiracastro.com.br/codigodeetica/codigo-de-etica-e-compliance-PT.pdf. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

FREEMAN, R.E. Strategic Management: A stakeholder approach. Pitman, 1984.

EDITORIAL. Iniciativa de autorregulação da OAB é bem-vinda. O Globo, 11 de janeiro de 2021. Disponível em https://oglobo.globo.com/opiniao/iniciativa-de-autorregulacao-da-oab-bem-vinda-24830377. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

GREGORIO, Rafael. Fusões e aquisições caem 5% em 2020, mas negócios no setor de tecnologia sobrem 19%. Valor Investe, São Paulo, 18 de janeiro de 2021. Disponível em https://valorinveste.globo.com/mercados/renda-variavel/empresas/noticia/2021/01/18/fusoes-e-aquisicoes-caem-5percent-2020-mas-negocios-no-setor-de-tecnologia-sobem-19percent.ghtml. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

TIRINI, Sofia. Clients should require their law firms to have robust compliance programs. The FCPA Blog, 27 de novembro de 2019. Disponível em https://fcpablog.com/2019/11/27/clients-should-require-their-law-firms-to-have-robust-compliance-programs/. Acesso em 22 de janeiro de 2021.

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