Apesar da dificuldade de olharmos positivamente para assuntos relacionados à corrupção e pandemia, ficou evidente que a crise e a escassez de recursos decorrentes delas, possibilitou um olhar mais profundo e menos tolerante por parte da sociedade sobre as consequências do saqueamento desenfreado dos recursos públicos.
Naturalmente cercada por incertezas, já que não é possível saber de antemão quantas pessoas ficarão doentes ou quando, nem que tipo de tratamento será o mais demandado ou recomendado, a cadeia de serviços da saúde precisa funcionar coordenada e colaborativamente. Governos, sistemas e planos de saúde, hospitais, farmácias e indústria de medicamentos, clínicas, laboratórios, consultórios médicos e pacientes precisam cumprir seus deveres e obrigações, de acordo com regras e procedimentos e, no caso específico do Brasil, em planejamento paralelo com o SUS (Sistema Único de Saúde). Isso torna a estrutura administrativa para a operação e controle do setor de saúde, seja público ou privado, bastante complexa, demandando expertise de áreas diversas de gestão, além da esfera médica.
Por se tratar desse ecossistema de difícil controle, o setor da saúde tem sido ele mesmo, um paciente em agonia e um terreno fértil para brotarem verdadeiras quadrilhas, responsáveis por desvios gigantescos de recursos, como o não tão recente, mas famoso caso, da “máfia das sanguessugas”, que simplesmente drenava o dinheiro público destinado à compra de ambulâncias.
O SUS tem inspiração no modelo do NHS (National Health Service) britânico prevendo cobertura universal aos que necessitam de saúde, independente dos recursos individuais. Contudo, ainda que seja dever do Estado financiar o SUS, esse financiamento acaba sendo insuficiente para atender a toda a demanda necessária, sendo que, segundo relatório da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) de 2019, o Brasil está entre os últimos do grupo de países desenvolvidos ou emergentes em termos de investimentos em saúde, com gasto per capita 30% abaixo da média, e com esse gasto representando apenas 4% do PIB. Isso sem contar a perda ao longo da cadeia de fornecimento de serviços, com os já modestos recursos se diluindo a cada repasse dos cofres dos governos até os leitos dos cidadãos.
Para sanar a sangria no sistema e tirar a saúde brasileira da UTI, recuperando-a da fase terminal em que se encontra, é vital a maior destinação de recursos para a saúde, mas não menos importante, a injeção de investimentos em sistemas de gestão com accountability para dar transparência à prestação de contas públicas, sem falar nos sistemas de compliance para blindar os recursos do setor, garantindo assim a sua sobrevida, possibilitando um ecossistema saudável, capaz de oferecer serviços com eficiência no atendimento à população.
Até o momento, investimentos em sistemas de controle e gestão na saúde, em especial para investigação de fraudes e desvios de recursos, são escassos e insuficientes, mesmo podendo considerá-los pífios diante do potencial de economia proveniente da redução da sangria financeira, através dos roubos e propinas impetrados por diversos agentes, em todas as esferas da saúde pública e privada.
A corrupção na saúde, é assim, um vírus contagioso, que onera sobremaneira o sistema, sabotando-o como um todo, matando sem chance de combate, a não ser por meio de “vacina preventiva” e prescrição punitiva contra crimes praticados contra a sociedade. Tal profilaxia já é aplicada com êxito a outros setores, por meio de instrumentos de compliance, governança e gestão de riscos de fraudes.
Infelizmente, vemos o quanto é comum que os sistemas de saúde não contem com ferramentas suficientes de rastreamento e monitoramento de recursos, o que, sem dúvida, facilita, e muito, que a corrupção seja recorrente e prolifere em ritmo infeccioso uma área tão essencial, que tem como missão, salvar vidas.
Contudo, cumpre lembrar ainda, que a corrupção no sistema de saúde começa também do indivíduo que finge estar doente para receber um atestado médico. Não é preciso dizer o quanto esse comportamento contribui para a escassez de recursos, fazendo com que pessoas realmente doentes deixem de ser atendidas ou que, por exemplo, tenham que esperar mais tempo em uma situação de real emergência, colocando vidas em risco.
Denise Debiasi é CEO da Bi2 Partners, reconhecida pelo expertise e reputação de seus profissionais nas áreas de investigações globais e inteligência estratégica, governança e finanças corporativa, conformidade com leis nacionais e internacionais de combate à corrupção, antissuborno e antilavagem de dinheiro, arbitragem e suporte à litígios, entre outros serviços de importância primeira em mercados emergentes.
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