A renegociação de dívidas e reestruturação do capital são medidas financeiras recomendadas nesse momento, para que as empresas recuperem o fôlego e cheguem ao final da pandemia em condições de voltar a crescer e se adaptar a novos hábitos de consumo.
Agora que a maioria das empresas retomaram suas atividades total ou parcialmente, sabemos que a situação de boa parte delas ainda é viável e que estão se recuperando. Porém, os índices ainda estão abaixo dos registrados pré-pandemia, tanto que a previsão, de acordo com pesquisa feita pelo SEBRAE[1], é de que mais algumas empresas declarem falência até o final do ano de 2020.
Gráfico 1: Evolução do índice de confiança em diversos setores
Fonte: FEBRABAN[2]
Como se pode observar pelo gráfico acima, o índice de confiança do empresário tem aumentado entre os meses de maio e setembro de 2020, chegando próximo de 100% no setor do comércio (índices perto ou acima de 100% são considerados otimistas).
Gráfico 2: Expectativas para a Economia
Fonte: Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo – CNC[3]
Gráfico 3: Expectativas para o Comércio
Fonte: Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo – CNC
Pelos gráficos acima podemos notar que tanto a expectativa para a economia quanto a expectativa para o setor do comércio aumentaram, estando respectivamente em 48,3% e 50,9%. Essa expectativa não é tão alta, mas já é um aumento, o que indica que o sentimento entre os empresários é de que a situação econômica siga melhorando.
Em relação à possibilidade de mais empresas declararem falência, um dos motivos para isso estar acontecendo é que, embora 47%[4] das empresas estivessem funcionando normalmente no mês de agosto, ou seja, quase metade das micro e pequenas empresas, dessa quantidade, 40% ainda não tem capital suficiente para seguir operando. Em relação às indústrias paulistas, 81% delas não possuem acesso ao financiamento promovido pelo Governo para se manterem operantes devido à burocracia. E dessas, 7% ainda pode falir.
Quanto às empresas de capital aberto, o Brasil, de modo geral, não possui um sistema eficiente para lidar com a recuperação judicial, pois muitas medidas necessárias para tal precisam passar pela aprovação de acionistas e, embora eles não tenham peso no assunto, podem barrar medidas.
Sobre o setor de bares e restaurantes
Ainda de acordo com pesquisa do SEBRAE, especificamente sobre o setor de bares e restaurantes, somente dois em cada dez empreendedores conseguiram algum recurso do Governo Federal ou de bancos privados para financiar o capital de giro, o que já levou ao fechamento de quatro em cada dez bares e restaurantes.
85% dos estabelecimentos que conseguiram seguir gerando receitas durante a pandemia, graças, em grande parte, ao serviço de delivery, viram suas contas serem bastante afetadas, sendo que a média nacional foi de 81%. Isso se deve ao fato de que esse setor é formado majoritariamente por MEIs que, devido à burocracia, como dito acima, não conseguiram ter acesso às linhas de crédito. Assim, 56% dos empresários precisaram de empréstimos para manter a operação em pé e aqueles que não conseguiram, ou fecharam ou investiram com capital próprio. Os dados também apontam que as empresas desse setor demitiram mais que os demais setores (12% em relação a 9%).
Apesar de tudo, 71% dessas empresas já retomaram mais de ¼ das vendas de julho e 38% dos empresários planeja investir em novos serviços e negócios nos próximos seis meses.
Exemplos de empresas passando por renegociação de dívidas
Latam Airlines[5]
A companhia aérea apresentou ao Tribunal do Distrito de Nova York uma proposta para financiar dívidas. O plano, no valor de US$ 2,45 bilhões, foi feito no modelo DIP (“debtor in possession”) e permite, aos credores que oferecem financiamento, prioridade no recebimento dos valores.
Oi[6]
A empresa de telefonia Oi e a Advocacia-Geral da União (AGU) devem assinar um acordo para renegociação de dívidas administrativas da empresa com a administração pública. A dívida é de cerca de R$ 13 bilhões, referentes às multas aplicadas pela Anatel desde 2010.
O projeto de lei em questão prevê que grandes companhias em recuperação judicial possam obter desconto de até 50% e parcelamento em até 84 meses.
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Como fazer uso da renegociação de dívidas
Há alguns programas ativos para renegociação de dívidas no momento, a maioria para pequenas e microempresas. Alguns deles são os programas da Receita Federal, da Caixa e do Banco do Brasil.
Receita Federal[7]
Foi liberado um edital pela Receita Federal que prevê o parcelamento de dívidas tributárias de pequeno valor, diante de descontos de 50%, desde que o valor total do débito de cada empresa não seja superior a R$ 62,7 mil.
De modo geral, o valor total do débito de pequeno valor atual é de R$ 10,7 bilhões, distribuídos entre 340 mil processos abertos. A intenção é que pelo menos cerca de R$ 5 milhões sejam recuperados, sendo que a previsão de arrecadação para este ano de 2020 é de R$ 300 milhões.
O percentual de desconto da dívida irá variar entre 20%, 30%, 40% e 50% do valor total e, quanto maior o parcelamento, menor o percentual disponibilizado.
A negociação poderá ser solicitada por pessoas físicas, pequenas e microempresas, exceto as que solicitaram o Simples Nacional. Débitos que já tenham sido negociados em alguma ocasião anterior ou que estejam suspensos perante a Justiça também não poderão fazer a solicitação.
As inscrições foram iniciadas no dia 16 de setembro e vão até o dia 29 de dezembro, por meio do e-CAC. Para participar basta preencher um formulário na página da Receita Federal. Assim que a negociação for liberada e o desconto concedido, o participante deverá dar uma entrada de 6%, calculado sobre o valor líquido da dívida.
Caixa Econômica Federal[8]
A Caixa lançou uma campanha chamada “Você no Azul” para renegociação de dívidas de contratos comerciais em atraso, que será realizada até o dia 31 de dezembro e oferece condições especiais para clientes da Caixa.
Quem fizer pagamento à vista terá desconto de até 90% do valor total e o público-alvo são pessoas com dívidas entre R$ 50 e R $5 milhões, sendo que a campanha abrange cerca de três milhões de pessoas e 359 mil empresas em todo o Brasil. Destas, mais da metade dos clientes possui dívidas de até R$ 3 mil.
O atendimento pode ser feito via Whatsapp, pelos números 0800 726 0104 ou 0800 726 8068, ou pelo próprio site da Caixa. No caso de clientes com dívidas de até R$ 2 mil os atendimentos serão feitos nas casas lotéricas. Ainda, serão oferecidos atendimentos em cinco caminhões que percorrerão todas as regiões do país.
Banco do Brasil[9]
O montante de R$ 7 milhões é o valor que já foi refinanciado pelo Banco Brasil também por Whatsapp, assim como a Caixa, para renegociação de dívidas.
O assistente virtual está disponível no API do Whatsapp Business e essa ferramenta facilita a comunicação de empresas de médio e grande porte e permite a renegociação de dívidas de até R$ 1 milhão. Ainda, é possível realizar cancelamento de acordo realizado, emitir segunda via de boleto de renegociação e liquidar acordos de forma antecipada. Também há a possibilidade de conversar com um atendente, porém todo o processo pode ser feito por meio de inteligência artificial.
Um caso especial: o governo do Ceará[10]
No dia 27 de agosto, o governador do Ceará, Camilo Santana, assinou um Projeto de Lei que institui o Programa Especial de Parcelamento de Créditos Tributários relativos ao ICMS de micro e pequenas empresas, de 1º de janeiro de 2020 a 31 de maio de 2020, como tentativa do governo do estado de minimizar os impactos causados pela pandemia. O Projeto também envolve a renegociação de dívidas referentes ao IPVA.
“Esses contribuintes correspondem a cerca de 90% das empresas do Estado. Além disso, o Refis prevê também o parcelamento do IPVA de 2020. Esse programa, que foi enviado para a Assembleia Legislativa, é uma medida que o Governo do Estado está realizando para minimizar os efeitos da pandemia aos cearenses, segundo o governador.
Pontos do programa
- Parcelamento do débito do ICMS, que poderá ser pago:
- Em até três parcelas mensais e sucessivas, com redução de até 100% das multas punitivas e moratórias e dos juros de mora;
- Em até oito parcelas mensais e sucessivas, com redução de até 85% das multas punitivas e moratórias e dos juros de mora;
- Em até 12 parcelas mensais e sucessivas, com redução de até 70% das multas punitivas e moratórias e dos juros de mora.
- O valor de cada parcela não pode ser inferior a R$ 200;
- O débito de IPVA 2020 pode ser parcelado em até três vezes, com redução de 100% das multas e dos juros de mora. Nesse caso, o valor de cada parcela não pode ser menor que R$ 50;
- A multa relativa ao descumprimento da obrigação de utilizar o MFE;
- Os débitos de ICMS e IPVA inscritos em dívida ativa há mais de 15 anos serão perdoados;
Os débitos inscritos em dívida ativa até 31 de agosto de 2015, até o limite de R$ 500, também serão perdoados, mesmo que ainda haja saldo de parcelamento não pago;
No caso de empresas com dívidas acima de 60 salários mínimos, elas precisam estar inativas há no mínimo cinco anos para conseguirem o benefício do perdão.
Conclusão
Para que seja feita a renegociação de dívida é necessário que o valor real da dívida seja conhecido, valor esse que deverá incluir os juros. Também é importante organizar as dívidas por ordem decrescente da taxa de juros, priorizando o pagamento das que possuem os juros mais altos. Feito isso, deve-se avaliar os novos programas disponibilizados pelos governos estaduais e federal para saber em qual a empresa se adequa em termos de custo-benefício e qual é melhor para o empresário, atentando-se para o prazo de pagamento, haja visto que, embora as empresas estejam se recuperando pouco a pouco, como dito no começo deste artigo, ainda teremos mais alguns meses até que os índices voltem aos registrados pré-pandemia e mais um tempo até que esses índices sejam superados.
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[1] Disponível em < https://www.gazetadopovo.com.br/bomgourmet/mercado-e-setor/emprestimos-capital-de-giro-dois-em-cada-dez-negocios/> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[2] Disponível em < https://cmsportal.febraban.org.br/Arquivos/documentos/PDF/ISEB_21%20set.pdf> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[3] Disponível em < http://cnc.org.br/editorias/economia/pesquisas/indice-de-confianca-do-empresario-do-comercio-icec-setembro-de-2020> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[4] Disponível em < https://noticias.r7.com/economia/cenario-das-industrias-melhora-mas-ainda-falta-capital-de-giro-para-40-07092020> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[5] Disponível em < https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/09/17/latam-apresenta-nova-proposta-de-reestruturao-de-dvida.ghtml> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[6] Disponível em < https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/09/22/oi-renegocia-dvidas-tributrias-com-agu.ghtml> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[7] Disponível em < https://www.jornalcontabil.com.br/receita-federal-oferece-50-de-desconto-em-renegociacao-de-dividas/> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[8] Disponível em < https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/09/10/caixa-lanca-campanha-de-renegociacao-de-dividas-com-descontos-de-ate-90percent.ghtml> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[9] Disponível em < https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-08/banco-do-brasil-renegocia-mais-de-r-7-milhoes-em-dividas-por-whatsapp> Acesso em 22 de setembro de 2020.
[10] Disponível em < https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2020/08/27/projeto-do-governo-do-ceara-propoe-renegociacao-de-dividas-do-icms-e-ipva.ghtml> Acesso em 22 de setembro de 2020.
Referências
ALVARENGA, Laura. Receita Federal oferece 50% de desconto em renegociação de dívidas. Jornal Contábil, 5 de setembro de 2020. Disponível em: https://www.jornalcontabil.com.br/receita-federal-oferece-50-de-desconto-em-renegociacao-de-dividas/. Acesso em 22 de setembro de 2020.
BERTÃO, Naiara. Renegociação de dívidas fica em segundo plano para maioria dos brasileiros na pandemia. Valor Investe, São Paulo, 12 de setembro de 2020. Disponível em: https://valorinveste.globo.com/objetivo/organize-as-contas/noticia/2020/09/12/renegociacao-de-dividas-fica-em-segundo-plano-para-maioria-dos-brasileiros-na-pandemia.ghtml. Acesso em 22 de setembro de 2020.
BOUÇAS, Cibelle e BRANDÃO, Raquel. Latam apresenta nova proposta de reestruturação de dívida. Valor Econômico, São Pulo, 17 de setembro de 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/09/17/latam-apresenta-nova-proposta-de-reestruturao-de-dvida.ghtml. Acesso em 22 de setembro de 2020.
G1 CE. Projeto do Governo do Ceará propõe renegociação de dívidas do ICMS e IPVA. G1, 27 de agosto de 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/ce/ceara/noticia/2020/08/27/projeto-do-governo-do-ceara-propoe-renegociacao-de-dividas-do-icms-e-ipva.ghtml. Acesso em 22 de setembro de 2020.
G1. Caixa lança campanha de renegociação de dívidas com descontos de até 90%. G1, 10 de setembro de 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/09/10/caixa-lanca-campanha-de-renegociacao-de-dividas-com-descontos-de-ate-90percent.ghtml. Acesso em 22 de setembro de 2020.
GRANDI, Guilherme. Empréstimos para financiar capital de giro chegaram a apenas dois em cada dez negócios. Gazeta do Povo, 24 de agosto de 2020. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/bomgourmet/mercado-e-setor/emprestimos-capital-de-giro-dois-em-cada-dez-negocios/. Acesso em 22 de setembro de 2020.
HIRATA, Taís. Onda de recuperações judiciais de empresas vai crescer, diz Eduardo Munhoz. Valor Econômico, São Paulo, 9 de setembro de 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/live/noticia/2020/09/09/onda-de-recuperacoes-judiciais-de-empresas-vai-crescer-diz-eduardo-munhoz.ghtml. Acesso em 22 de setembro de 2020.
INFORMATIVO SEMANAL DE ECONOMIA BANCÁRIA – 21 A 25 DE SETEMBRO DE 2020. FEBRABAN, 2020. Disponível em: https://cmsportal.febraban.org.br/Arquivos/documentos/PDF/ISEB_21%20set.pdf. Acesso em 22 de setembro de 2020.
MARTINS, Luísa. Oi renegocia dívidas administrativas com AGU. Valor Econômico, Brasília, 22 de setembro de 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/empresas/noticia/2020/09/22/oi-renegocia-dvidas-tributrias-com-agu.ghtml. Acesso em 22 de setembro de 2020.
MÁXIMO, Wellton. Banco do Brasil renegocia mais de R$7 milhões em dívidas por WhatsApp. Agência Brasil, Brasília, 25 de agosto de 2020. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2020-08/banco-do-brasil-renegocia-mais-de-r-7-milhoes-em-dividas-por-whatsapp. Acesso em 22 de setembro de 2020.
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REUTERS – ECONOMIA. Cenário das indústrias melhora, mas ainda falta capital de giro para 40%. R7, 7 de setembro de 2020. Disponível em: https://noticias.r7.com/economia/cenario-das-industrias-melhora-mas-ainda-falta-capital-de-giro-para-40-07092020. Acesso em 22 de setembro de 2020.
