Como profissional dedicada à governança corporativa, observo atentamente os eventos que moldam o cenário empresarial brasileiro. A partir de análises de casos públicos, desenvolvo reflexões que nos ajudam a aprimorar nossas práticas de gestão e controle.
Quando uma grande corporação perde dezenas de bilhões em valor, você espera encontrar falhas graves em seus controles internos. No entanto, já aconteceu de ser encontrada algo ainda mais complexo: uma sofisticada rede de operações que partiu justamente de quem deveria proteger a companhia.
Analisando este caso emblemático, encontramos um cenário que desafia nossa compreensão tradicional de governança corporativa. A empresa em questão, segundo informações públicas, possuía um dos canais de denúncia mais modernos do mundo. Mantinha políticas de compliance atualizadas. Seu conselho de administração era composto por nomes respeitados no mercado. Ainda assim, operações irregulares prosperaram por mais de uma década.
Como isso foi possível? A resposta merece uma análise técnica aprofundada: as irregularidades nasceram e cresceram no coração da gestão executiva. As investigações oficiais, já divulgadas publicamente, revelaram um sistema que envolvia diversos níveis hierárquicos da companhia.
Você pode questionar: como ninguém percebeu? A complexidade das operações foi notável. As demonstrações financeiras foram manipuladas de forma tão meticulosa que passaram por auditorias, agências de rating e até mesmo analistas bancários experientes. Operações financeiras e verbas promocionais foram ocultadas, mantendo uma aparência de solidez.
O que chama atenção não é apenas a extensão das irregularidades, mas o distanciamento do compromisso ético. Em uma organização onde a liderança principal se afasta das boas práticas, a cultura de compliance torna-se apenas uma fachada.
Este episódio nos traz uma reflexão fundamental: a governança corporativa não é um conjunto de regras e procedimentos que funcionam no automático. Ela é, antes de tudo, um reflexo direto dos valores e do comportamento da liderança. Quando os principais executivos de uma empresa decidem ignorar controles, eles não apenas quebram regras – eles comprometem toda a cultura organizacional.
Por isso, você que atua em governança corporativa precisa entender: nosso trabalho começa na seleção e no monitoramento da alta liderança. Precisamos estabelecer mecanismos que garantam não apenas a competência técnica, mas principalmente a integridade moral daqueles que ocupam os cargos mais altos.
Esta história não é apenas mais um caso público corporativo. É uma oportunidade de reflexão sobre como a ética empresarial depende fundamentalmente do exemplo que vem de cima. Sem uma liderança comprometida com a integridade, até o mais robusto sistema de compliance pode se tornar ineficaz.
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Denise Debiasi é CEO da Bi2 Partners (conheça melhor aqui), reconhecida pela expertise e reputação de seus profissionais nas áreas de investigações globais e inteligência estratégica, governança e finanças corporativas (saiba mais), conformidade com leis nacionais e internacionais de combate à corrupção (saiba mais), antissuborno e antilavagem de dinheiro, arbitragem e suporte a litígios (saiba mais), entre outros serviços de primeira importância em mercados emergentes.