Você e eu estamos vendo a história acontecer diante dos nossos olhos: a adoção acelerada de IA está redesenhando tarefas, cargos e expectativas. Dario Amodei, CEO e cofundador da Anthropic (e ex-líder de pesquisa na OpenAI), alertou que até metade dos postos de nível júnior pode ser substituída por IA — um recado que exige de nós franqueza com as pessoas e responsabilidade com os impactos. Ética e integridade não podem ser acessórios nesse movimento — são o alicerce para decisões que afetarão carreiras inteiras.
Os números recentes mostram a dimensão da transição. Em 2025, cortes ocorreram em diferentes setores: Adidas reduziu até 500 vagas na sede; Boeing encerrou 400 postos ligados ao Artemis; BP dispensou 4.700 funcionários e 3.000 contratados; CNN cortou, aproximadamente, 200 cargos de TV; Starbucks, 1.100 corporativos; UPS, 20.000 e fechamento de 73 prédios; PwC, 1.500.
Na consultoria, a Accenture reportou mais de 11 mil desligamentos em três meses, um programa de reestruturação de US$ 865 milhões, US$ 615 milhões já gastos com indenizações (e mais US$ 250 milhões previstos), 779 mil colaboradores e US$ 5,1 bilhões em novos contratos de IA generativa — além de 77 mil profissionais especializados em dados e IA. O contraste é claro: demissões em áreas maduras e contratações em capacidades digitais.
Ao mesmo tempo, funções em big data, fintech e IA devem dobrar até 2030, e 41% das empresas projetam reduzir equipes nos próximos cinco anos com a automação.
O que é agir com integridade nesse contexto? Primeiro, dizer a verdade. Se a estratégia prevê automatização que tornará um conjunto de atividades redundantes, informar cedo, com métricas e prazos, é um dever. Transparência não elimina a dor, mas reduz desconfiança e ruídos. Segundo, oferecer trilhas reais de requalificação, com metas verificáveis e apoio prático (tempo protegido para estudo, mentoria, certificações).
Prometer “reskilling” sem orçamento, curadoria e medição é só adiar o problema. Terceiro, adotar critérios objetivos nas movimentações: quem permanece, quem migra e quem sai deve estar ancorado em competências, desempenho e aderência à nova arquitetura de papéis — e não em proximidade política ou vieses.
Há também a governança da própria IA. Se você usa modelos para orientar alocação de pessoas, precisa explicar premissas, monitorar vieses e permitir contestação. Decisões automatizadas que não podem ser auditadas ferem a confiança. Integridade aqui significa documentar dados, limites de uso e planos de contingência, além de comunicar o que a IA não faz bem e onde a supervisão humana é indispensável.
Cuidar de quem sai é parte inseparável da reputação de quem fica. Pacotes justos, extensão de benefícios, apoio psicológico e encaminhamento para recolocação mostram que você valoriza pessoas mesmo quando precisa tomar decisões duras. O mercado observa — e seus times também. Em momentos de incerteza, a cultura se revela não nos slogans, mas na qualidade dos processos.
A transição para o trabalho aumentado por IA pode ser um avanço de produtividade e carreira para você. Para isso, proponho três movimentos concretos: mapear tarefas que serão automatizadas e as novas competências necessárias; publicar um calendário de requalificação com metas mensais; e instalar um comitê de governança de IA que reporte ao conselho. Sem esse tripé — transparência, requalificação e governança — o risco é trocar eficiência de curto prazo por perda de confiança duradoura.
Você talvez não escolha o ritmo tecnológico, mas pode escolher a forma. Integridade é essa escolha diária — especialmente quando custa.
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Denise Debiasi é CEO da Bi2 Partners, reconhecida pela expertise e reputação de seus profissionais nas áreas de compliance e inteligência investigativa, finanças corporativas, consultoria regulatória (AML, BSA e LGPD), contabilidade forense, Due Diligence (financeiro, reputacional, investigativo e operacional), investigações corporativas, antilavagem de dinheiro, FCPA e anticorrupção, entre outros serviços de primeira importância em mercados emergentes.